segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

2013: O ano rubro-negro

Eu poderia começar meu primeiro texto neste nobre espaço, no dia 9 de dezembro de 2013, desejando boa vasco-feira ou boa fluminense-feira para os leitores, mas não faria isso por dois motivos: não seria deselegante com o dono do boteco nem vivo em função dos meus clientes municipais. Começo minha participação no Torcedor de Radinho chegando à conclusão que 2013 foi um ano rubro-negro.

“Lá vem essa megalomania flamenguista, os caras ganharam um título e acham que passaram o rodo”, devem pensar alguns imediatistas. O ano rubro-negro do título não tem este significado. Eu quis dizer que, em 2013, o Flamengo foi Flamengo em sua essência.

Tirando os alienados/alucinados/amalucados, não teve um torcedor do Flamengo que não tivesse começado este ano temendo o pior – no nosso caso, o pior é ser ejetado da Primeira Divisão do futebol brasileiro. Time fraco em campo, diretoria nova com discurso de austeridade, dizendo que não haveria contratações de impacto. Segundo turno vexatório do Campeonato Carioca. Nego comemorando Certidão Negativa de Débito. O panorama em maio era sombrio. Mas existia uma Copa do Brasil e existia uma Nação.

Duque de Caxias comemora contra o Flamengo: o ano começou mais feio que bater em mãe

O Flamengo foi muito Flamengo em 2013. Quatro técnicos, um monte de perebas se revezando em campo. Padrão tático no melhor estilo “vamo lá porra” que norteia o clube desde 1912. Campeonato Brasileiro começou como era esperado, ou seja, mal. Para piorar, o líder do campeonato era o próximo adversário na Copa do Brasil. Mas um golzinho vadio de Carlos Eduardo – ou Cazeduá, pros chegados – fez a Nação acreditar que dava no Maracanã. E quando a Nação acha que dá...

Dizem que torcida não ganha jogo. Não sei a sua, mas a minha ganha. Obviamente não vai ganhar todos, não precisa ter mais do que dez gramas de massa encefálica pra saber. Mas quando a Nação bota o time no colo e incendeia o Maracanã, perebas viram craques, centroavantes criticados viram artilheiros, caçadores de borboleta viram paredões, reforços duvidosos viram xerifes. Milagres acontecem.

O milagre aconteceu no apagar das luzes contra o Cruzeiro. Líder do Brasileiro e eventual campeão batido. O próximo passo era contra o Botafogo, um time muito mais qualificado que o Flamengo, também entre os melhores do Brasileiro. E, pior, vencera o próprio Flamengo dez dias antes. Jogo de ida, empate, como tem acontecido tantas vezes nos últimos anos. Na volta, o Botafogo parecia jogar fora de casa. A Nação tava lá, lotou o Maracanã e empurrou o time limitado. E o time limitado deu de 4 no último trivice e seguiu sua escalada.

A história se repetiu na semifinal e na grande decisão. Novamente os oponentes eram integrantes do G-4 do Brasileiro, mas, com a moral reforçada e a Nação nas costas, o Flamengo dominou os quatro jogos, venceu três e acabou campeão da Copa do Brasil mais difícil da história, a única até hoje que contou com todos os clubes da elite do país.

Flamengo acabou o ano deitando e rolando

A nova diretoria parece ter muito boas intenções, mas dizem que, de boas intenções, o inferno está cheio. Os dirigentes cometeram alguns erros típicos de quem ainda não está acostumado com os meandros do futebol brasileiro. Mas tiveram dois acertos fundamentais: pagaram em dia e foram honestos com seus funcionários o ano inteiro, coisas que dois de nossos coirmãos falharam e pagaram um preço alto. O 2013 que começou parecendo ser um ano de chumbo acabou como um ano de ouro, com outra taça nacional a abrilhantar a abarrotada sala de troféus da sede da Lagoa Rodrigo de Freitas, a vaga na Libertadores de 2014 assegurada e a Nação feliz por ter conquistado mais um título para seu time do coração.

sábado, 7 de dezembro de 2013

Racing Montevideo x Montevideo Wanderers - Sob o olhar de um brasileiro.

Olá amigos.

Faz muito tempo que não escrevo nada não relacionado a lutas e a vontade de quebrar este hiato já tinha aparecido, mas me faltava um bom assunto, algo que me desse a oportunidade de voltar a este espaço. Resolvi falar da minha estadia recente em Montevidéu, mais especificamente do jogo entre o Racing Montevideo e o Montevideo Wanderers. 


Antes do relato, melhor contextualizar. O Campeonato Uruguaio é bem diferente do nosso Brasileirão. Dos 16 times da primeira divisão, nada menos que 14 são da capital. O campeonato costuma ser muito polarizado entre Nacional e Peñarol (assim como o coração dos torcedores), com uma ou outra interferência de times como Danubio, Defensor e River Plate. Wanderers e Racing fazem campanhas intermediárias, ocupando as 7ª e 11ª posições, respectivamente. O Racing é um típico clube de bairro, como vemos alguns no Brasil, com torcedores que moram nos arredores de um acanhado estádio e um clube que raramente incomoda os grandes.

O jogo estava marcado para as 10:15 da manhã do domingo, horário pouco comum na elite do futebol brasileiro, mas aqueles que acompanham as divisões inferiores do nosso futebol (o que definitivamente não é o meu caso) estão mais que habituados. 

Com a "experiência" de quem havia visto um jogo do Peñarol no Centenário no sábado, não fiz questão de acordar muito cedo, uma vez que as ruas de Montevidéu são absolutamente tranquilas (muita inveja) e o estádio Parque Osvaldo Roberto fica a apenas 10 minutos de carro do hotel onde eu estava. Acordei às 9:00, peguei o café do hotel e segui com o brother Dudu para a cancha, onde chegamos às dez em ponto.

Nenhum problema para estacionar o carro, deixamos na rua lateral do estádio. Um flanelinha (muito incomum no Uruguai) tentou nos abordar, mas escapamos dizendo "no compriendo" no portunhol mais sem vergonha jamais visto abaixo do Trópico de Capricórnio. A bilheteria não tinha nenhuma fila apesar da proximidade do início da partida, pagamos os 150 pesos uruguaios (algo entre 16 e 17 reais) pelo nosso ingresso e entramos no acanhado estádio.

A arena do Racing é simples. Na verdade é EXTREMAMENTE SIMPLES, com uma pequenina construção que parece ser a sala do administrador do estádio e estava fechada no dia do jogo. Na parede, está escrito em tinta verde com o marcante orgulho que os uruguaios têm de suas paixões: "RACING CLUB de MONTEVIDEO" em letras grandes e "FUNDADO EL 6 DE ABRIL DE 1919" abaixo, em letras menores. Na frente desta construção, o nome "RACING" em cimento, sobre um simples banquinho verde. Tudo sob a sombra de um lindo e enorme pinheiro que deve ser mais antigo que o estádio.



O campo fica atrás desta construção, com acesso para as arquibancadas pelas laterais, o mandante pelo lado esquerdo e o visitante pelo lado direito. No lado do mandante, no pequeno corredor que leva às arquibancadas uma barraquinha parecida com a de um camelô que vendia bonés, gorros, chaveiros, shorts, cadernos e camisas do clube, tudo com uma qualidade duvidosa e preços pouco convidativos. 



A arquibancada é pequena e parecida com alguns estádios de pequenos clubes brasileiros. Nada de bancos, poltronas, lugar marcado, climatização e luzes coloridas. É bunda no cimento e sol no meio dos cornos por duas horas sem perdão. Placar não existe, seja computadorizado, eletrônico, manual ou aquela plaquinha escrita "Visitante", nada mesmo. Os uruguaios comparecem bem (imagino que cerca de três mil pessoas estavam no estádio) e estão sempre com suas garrafinhas térmicas de chimarrão, mesmo com a temperatura alta que fazia. A torcida do Wanderers (clube um pouco mais forte tradicionalmente que o Racing) fez mais festa na entrada dos times que a torcida mandante, o que me deu até vontade de mudar de lado, mas permaneci fiel aos "cerveceros". 



O banco de reservas é um parágrafo a parte no Parque Osvaldo. Localizado nas laterais do campo de jogo, em um curtíssimo espaço entre a linha lateral e o alambrado da torcida, o banco é um desses de concreto que encontramos nas pracinhas mais antigas. Sem nenhuma cobertura, proteção contra o sol,  xingamentos ou objetos arremessados pela torcida e conforto zero! É possível se aproximar e ficar conversando com os jogadores reservas, como algumas crianças presente faziam. Inclusive tinha um garotinho que a mãe ficava mandando dar tchauzinho para o papai, um dos suplentes de "La Escuelita".



Enfim a peleja teve início e o Wanderers partiu com tudo nos primeiros minutos, acuando os donos da casa e dando a impressão que marcaria a qualquer momento. E logo aos nove minutos, Sergio "Chapita" Blanco um andarilho e veterano artilheiro, uma espécie de Carlinhos Bala charrúa, abriu o placar para "los bohemios"' desviando de cabeça uma cobrança de falta. 

Depois do gol, curiosamente a torcida local acordou, passou a incentivar a equipe, que passou a organizar melhor seus ataques. Diego Zabala e Daniel Acosta (que durante o jogo eu só chamava de 18 e 14) tramavam boas jogadas pelo lado esquerdo de ataque e chegavam com perigo. Em uma cobrança de escanteio após um milagre feito pelo goleiro Cristóforo, Zabala achou o capitão Rodrigo Brasesco livre na área para empatar em uma fácil cabeçada . 

Depois de CENAS LAMENTÁVEIS® protagonizadas em um lance que um zagueiro do Racing chegou pesadíssimo no Chapita, o Racing conseguiu a virada ainda no primeiro tempo. Acosta foi derrubado na área e Luis Gorosito, sob protestos tímidos da torcida cobrou para marcar 2 a 1 no placar (nesse caso é apenas modo de falar).  E não faltou o sinalizador com fumaça dentro de campo, interrompendo o jogo por alguns minutos.



Não há muito a se fazer no intervalo, talvez comer um pancho (cachorro-quente) e beber um refrigerante (também não vendem cerveja nos estádios uruguaios) com preços salgados. Mesmo assim fiquei tirando umas fotos, fui ao banheiro e quase perdi o gol de empate dos bohemios, mais uma vez marcado por Blanco, em nova cobrança de falta, escorada desta vez com um carrinho muito oportunista.

Mas a torcida racinguista não se abalou. Jogando bem, o time dominou o segundo tempo com grande atuação de Zabala. E novamente o meia fez dobradinha com o capitão Brasesco em cobrança de escanteio para superar Crisóstofo aos quinze minutos: cabeçada fulminante, 3 a 2 e bonita festa dos cerveceros. 

Foi então que apareceu a grande figura da partida: um senhor ranzinza bem próximo a mim na arquibancada desandou a descascar o treinador Rosário Martinez, xingando-o, exigindo a substituição de Gorosito (que caiu em desgraça com a torcida após perder um pênalti na partida contra o Peñarol). O poder vocal e a insistência na corneta era de matar qualquer Seu Walter de inveja. Sua voz está registrada no vídeo do gol de Gorosito de pênalti, quando ele vuvuzela o batedor um segundo antes da cobrança. 

O Racing então cansou, precisou substituir Zabala e Acosta, seus jogadores mais criativos e cedeu espaços para o Wanderers. O castigo veio aos 38 minutos do segundo tempo, com um pênalti cometido de forma infantil que permitiu ao endiabrado Blanco fazer o seu hat-trick, colocando números finais no jogo. 

Antes do apito final, ainda houve tempo para uma nova aparição das CENAS LAMENTÁVEIS® em um lance engraçado após um atacante do Racing se enroscar no pescoço do goleiro do Wanderers que levantou com jogador na "carcunda", fazendo-o dar uma cambalhota no ar. Infelizmente perdi o lance inusitado, mas o "desenrolo" da confusão está aí, tão mal filmada por mim quanto a cobrança do pênalti.



Fim de jogo, os torcedores do Racing ficaram chateados por ceder o empate no fim, mas eu saí muito feliz do estádio. Assisti a um jogo de futebol muito divertido, vivi a cultura de torcedores que amam seu clube incondicionalmente, sem esperar nada em troca (nem mesmo vitórias ou títulos), além de possivelmente ter assistido um possível jogador importante do futebol uruguaio em seu início de carreira: Zabala, de 22 anos, líder em assistências do campeonato uruguaio, que brevemente estará em um dos gigantes do futebol local. 

O mais importante é ver o quão apaixonante é o futebol e imaginar quantos estádios simplórios como o Parque Osvaldo recebem partidas, torcedores e suas emoções em um fim de semana espalhados pelo planeta. Quantos coroas corneteiros não pedem para que "se cambie" Gorositos por este mundão afora? Quantos Rosários não são xingados e vibram junto com os adeptos a cada gol? E eu saí deste estádio com um imenso lamento por algumas pessoas. Deve ser muito triste não gostar deste assunto, o "mais importante entre as coisas menos importantes". 

Viva o futebol!




Ficha do jogo: 


Local: estádio Parque Osvaldo Roberto em Montevidéu. Árbitros: Jonathan Fuentes, Eduardo Aguirre e Daniel Olivera.
RACING: Leandro Gelpi, Jesús Trindade, Rodrigo Brasesco, Pablo Lacoste, Enzo Ruiz, Carlos Díaz, Ernesto Dudok,   Agustín Gutiérrez (68′ Leandro Ezquerra), Diego Zabala (86′ Cristian Tabó), Carlos Acosta (90′ Marcelo Gamarra) e Luis Gorocito. Técnico: Rosario Martínez.
WANDERERS: Federico Cristóforo, Mauricio Gómez, Gastón Bueno, Martín Díaz, Maximiliano Olivera, Santiago Martínez, Matías Santos, Adrián Colombino (64′ Diego Riolfo), Gastón Rodríguez (76′ Yuri Galli), Rodrigo Pastorini (87′ Pablo Lavandeira) e Sergio Blanco. Técnico: Alfredo Arias.
GOLS: 9′, 47′ e 83′ Sergio Blanco (W), o terceiro dele foi marcado num pênalti, 28′ e 60′ Rodrigo Brasesco (R), 45′ Luis Gorocito (R) pênalti.
Cartões amarelos: 14′ Ernesto Dudok (R), 16′ Adrián Colombino (W), 18′ Carlos Díaz (R), 24′ Gastón Rodríguez (W), 45′ Gastón Bueno (W), 48′ Enzo Ruiz (R), 73′ Rodrigo Brasesco (R) e Federico Cristóforo (W).