segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

O VELHO E O GAROTO

O pai do garoto foi mais uma vítima fatal da violência tão alarmada nas grandes cidades brasileiras. A mãe, ainda muito jovem, não teve muitas opções se não voltar para a casa dos pais com o garoto e a irmãzinha caçula.

Dentre as poucas lembranças que o garoto tem do falecido pai, estão as intermináveis discussões com o velho sogro sobre o mais importante dentre os assuntos menos importantes: o futebol. O pai vascaíno e o avô tricolor disputavam a preferência do pirralho com mimos, informações e até dinheiro.

Impulsionado pelo pai, mas inexplicável, como nascem todos os amores, o moleque escolheu o lado cruzmaltino da guerra, e teve alguns dissabores no início, uma vez que nos anos 80, o Fluminense era uma verdadeira pedra no sapato do clube de São Januário, culminando na dramática eliminação nas quartas-de-final do Brasileirão de 1988. O avô não perdia uma oportunidade de tripudiar, uma vez que agora eram dois os fregueses.

Depois da tragédia citada no primeiro parágrafo, o velho assumiu com maestria o papel de pai. O salário era tímido, mas sempre se dava um jeito de agradar aos dois pequenos netos respondões e debochados. Ao garoto, o avô ainda dedicava algumas aulas sobre futebol, suas histórias e ensinamentos, sempre carregados de sabedoria, bom humor e uma indisfarçada queda para o lado de seu querido Fluminense em todas as histórias.

O garoto aprendeu termos que hoje não são tão usados como “abriu o score”, “córner”, “quarto-zagueiro”, “azougue” e “joga pra dedéu”. E aprendeu que Castilho foi o maior goleiro da história do mundo. E que Rivelino depois de duzentos anos no Corinthians, veio para o Fluminense para ser campeão pela primeira vez na carreira na inesquecível máquina tricolor.

Sentar na cama do velho, ouvir futebol no rádio com narração de José Carlos Araújo era o que tinha de mais sagrado em um domingo de tarde. Nunca mais esquecerá “vai mais, vai mais, vai mais garotinho”, “deu uma quebra de asa”, “apite comigo galera” e adorava quando tinha a eleição para a “cremilda”, destinada ao pior jogador em campo. Nas segundas à noite, era dia de ver futebol na TV, com Januário de Oliveira esbanjando categoria na narração. Januário imortalizou o “taí o que você queria”, “é disso que o povo gosta”, “olhos nos olhos, se passar fica na boa” e o “cruel, muito cruel”.

Mais crescido, o garoto passava a comandar as ações nas gozações, ajudado pela boa fase do Vasco, que chegou a conquistar o Brasil e a América em anos seguidos, enquanto o tricolor das Laranjeiras amargava uma triste queda à terceira divisão nacional. Aliás uma das passagens mais tocantes foi quando o velho, pouco antes do Fluminense x Vitória pela última rodada do Brasileiro de 1996, afirmou que se o Flu terminasse rebaixado, jamais torceria novamente pelo clube. Óbvio que a promessa foi descumprida logo no primeiro jogo após a queda. E é óbvio que o garoto não cobrou a promessa, ele gostava daquela “rivalidade”, mais até do que isso, ele PRECISAVA do velho assistindo jogos com ele (ou contra ele).

Além do radinho e da TV, velho e garoto iam juntos a estádios de vez em quando. Inclusive, o velho estava presente na primeira vez do garoto (que ele tenha alguma lembrança) em um estádio de futebol, logo no maior do mundo. Naqueles anos 80 de freguesia, o garoto fã de Mazinho, Romário e Geovane viu Paulo Victor e Romerito brilharem na vitória tricolor por 2 a 0, com dois gols do gringo.

Algumas vezes o velho levava o garoto até o campo de Moça Bonita para algum Bangu x Vasco ou Bangu x Fluminense. Chegaram a ver um Fluminense x Goiânia pela Série C, com show dos garotos Roni e Roger. E como era divertido para o garoto, ver um jogo de futebol – qualquer que fosse o jogo – ao lado de seu velho avô.

Com o tempo, o garoto passou a tentar retribuir tudo o que aquele velhote tinha feito por ele. Ajudava nas despesas da família, pagava TV a cabo para o avô ter sempre um futebolzinho bacana para curtir sua aposentadoria. Levava o velho ao campo do Bangu, ao recém-inaugurado Engenhão e ao bom e velho Maracanã para que voltassem aqueles momentos inesquecíveis e deliciosos.

Nunca conseguiu retribuir. Nem financeiramente, muito menos em amor, carinho, sabedoria e formação de caráter, tudo o que aquele velhinho de entradas no cabelo e bigode respeitável o ensinou. E se hoje, o garoto tenta ser uma pessoa de bem, fazer sempre o bem a todos a sua volta e dar todo o merecido valor à sua família e aos seus amigos, isso é muito por conta da educação liderada pelo véio.

Daqui a pouco fará quatro anos (nunca me preocupei em gravar a data) que o velho deixou o garoto órfão pela segunda vez. Até hoje, o garoto sente muita, MUITA falta daquele velhote maravilhoso. Hoje, em específico, o garoto resolveu escrever uma pequena, mas merecida homenagem. E deixou cair livremente algumas lágrimas de saudade.

Passam dores, passam mágoas,
Mas a saudade não passa.”


segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Obrigado, meu Rei

Obrigado pelas faltas cirúrgicas. Sejam elas no mais inalcançável ângulo reto da meta ou açucarada na direção de um companheiro sortudo por jogar ao seu lado. 



Obrigado pela virada na Copa Mercosul, a mais sensacional das viradas, cuja imagem mais marcante é a sua mostrando todas as veias possíveis e batendo na junção do seu coração real com a sagrada cruz de malta, imagem que arrepia todos os pelos do mais gelado vascaíno. 




Obrigado pelo gol maravilhoso na final do Mundial de Clubes, onde infelizmente não ganhamos, mas tivemos a certeza que poderíamos disputar de igual pra igual com qualquer time naquele momento, até aquele milionário com jogadores de todas as seleções mundiais. E pensar que dois anos antes éramos apenas o décimo oitavo no Brasileirão.




Obrigado pelo golaço na final do Brasileirão de 2000, abrindo o caminho para nosso quarto título, o seu segundo. A comemoração contida, triste até, mostrava o quanto era difícil a separação entre você e nossa torcida. 



Obrigado principalmente pela Libertadores. Por aquele gol maravilhoso, mágico, único, MONUMENTAL, o nosso gol do título. O gol que virou a mais bonita música de torcida nos estádios brasileiros.





Obrigado por ser o maior ídolo da melhor torcida do mundo. Por ser o maior ídolo da história de um dos maiores clubes do Brasil e do mundo. Clube que já teve gente do naipe de Romário, Roberto Dinamite, Ademir Menezes, Edmundo e Tostão honrando sua camisa. E de quebra ainda arrumar tempo para ser o maior jogador da história do Campeonato Francês, aquele que já viu Platini e Zidane.


Cada vascaíno, de qualquer idade, credo e nacionalidade sentirá muita falta de ser seu súdito. 


MUITO OBRIGADO POR TUDO, MONARCA!




segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

2013: O ano rubro-negro

Eu poderia começar meu primeiro texto neste nobre espaço, no dia 9 de dezembro de 2013, desejando boa vasco-feira ou boa fluminense-feira para os leitores, mas não faria isso por dois motivos: não seria deselegante com o dono do boteco nem vivo em função dos meus clientes municipais. Começo minha participação no Torcedor de Radinho chegando à conclusão que 2013 foi um ano rubro-negro.

“Lá vem essa megalomania flamenguista, os caras ganharam um título e acham que passaram o rodo”, devem pensar alguns imediatistas. O ano rubro-negro do título não tem este significado. Eu quis dizer que, em 2013, o Flamengo foi Flamengo em sua essência.

Tirando os alienados/alucinados/amalucados, não teve um torcedor do Flamengo que não tivesse começado este ano temendo o pior – no nosso caso, o pior é ser ejetado da Primeira Divisão do futebol brasileiro. Time fraco em campo, diretoria nova com discurso de austeridade, dizendo que não haveria contratações de impacto. Segundo turno vexatório do Campeonato Carioca. Nego comemorando Certidão Negativa de Débito. O panorama em maio era sombrio. Mas existia uma Copa do Brasil e existia uma Nação.

Duque de Caxias comemora contra o Flamengo: o ano começou mais feio que bater em mãe

O Flamengo foi muito Flamengo em 2013. Quatro técnicos, um monte de perebas se revezando em campo. Padrão tático no melhor estilo “vamo lá porra” que norteia o clube desde 1912. Campeonato Brasileiro começou como era esperado, ou seja, mal. Para piorar, o líder do campeonato era o próximo adversário na Copa do Brasil. Mas um golzinho vadio de Carlos Eduardo – ou Cazeduá, pros chegados – fez a Nação acreditar que dava no Maracanã. E quando a Nação acha que dá...

Dizem que torcida não ganha jogo. Não sei a sua, mas a minha ganha. Obviamente não vai ganhar todos, não precisa ter mais do que dez gramas de massa encefálica pra saber. Mas quando a Nação bota o time no colo e incendeia o Maracanã, perebas viram craques, centroavantes criticados viram artilheiros, caçadores de borboleta viram paredões, reforços duvidosos viram xerifes. Milagres acontecem.

O milagre aconteceu no apagar das luzes contra o Cruzeiro. Líder do Brasileiro e eventual campeão batido. O próximo passo era contra o Botafogo, um time muito mais qualificado que o Flamengo, também entre os melhores do Brasileiro. E, pior, vencera o próprio Flamengo dez dias antes. Jogo de ida, empate, como tem acontecido tantas vezes nos últimos anos. Na volta, o Botafogo parecia jogar fora de casa. A Nação tava lá, lotou o Maracanã e empurrou o time limitado. E o time limitado deu de 4 no último trivice e seguiu sua escalada.

A história se repetiu na semifinal e na grande decisão. Novamente os oponentes eram integrantes do G-4 do Brasileiro, mas, com a moral reforçada e a Nação nas costas, o Flamengo dominou os quatro jogos, venceu três e acabou campeão da Copa do Brasil mais difícil da história, a única até hoje que contou com todos os clubes da elite do país.

Flamengo acabou o ano deitando e rolando

A nova diretoria parece ter muito boas intenções, mas dizem que, de boas intenções, o inferno está cheio. Os dirigentes cometeram alguns erros típicos de quem ainda não está acostumado com os meandros do futebol brasileiro. Mas tiveram dois acertos fundamentais: pagaram em dia e foram honestos com seus funcionários o ano inteiro, coisas que dois de nossos coirmãos falharam e pagaram um preço alto. O 2013 que começou parecendo ser um ano de chumbo acabou como um ano de ouro, com outra taça nacional a abrilhantar a abarrotada sala de troféus da sede da Lagoa Rodrigo de Freitas, a vaga na Libertadores de 2014 assegurada e a Nação feliz por ter conquistado mais um título para seu time do coração.

sábado, 7 de dezembro de 2013

Racing Montevideo x Montevideo Wanderers - Sob o olhar de um brasileiro.

Olá amigos.

Faz muito tempo que não escrevo nada não relacionado a lutas e a vontade de quebrar este hiato já tinha aparecido, mas me faltava um bom assunto, algo que me desse a oportunidade de voltar a este espaço. Resolvi falar da minha estadia recente em Montevidéu, mais especificamente do jogo entre o Racing Montevideo e o Montevideo Wanderers. 


Antes do relato, melhor contextualizar. O Campeonato Uruguaio é bem diferente do nosso Brasileirão. Dos 16 times da primeira divisão, nada menos que 14 são da capital. O campeonato costuma ser muito polarizado entre Nacional e Peñarol (assim como o coração dos torcedores), com uma ou outra interferência de times como Danubio, Defensor e River Plate. Wanderers e Racing fazem campanhas intermediárias, ocupando as 7ª e 11ª posições, respectivamente. O Racing é um típico clube de bairro, como vemos alguns no Brasil, com torcedores que moram nos arredores de um acanhado estádio e um clube que raramente incomoda os grandes.

O jogo estava marcado para as 10:15 da manhã do domingo, horário pouco comum na elite do futebol brasileiro, mas aqueles que acompanham as divisões inferiores do nosso futebol (o que definitivamente não é o meu caso) estão mais que habituados. 

Com a "experiência" de quem havia visto um jogo do Peñarol no Centenário no sábado, não fiz questão de acordar muito cedo, uma vez que as ruas de Montevidéu são absolutamente tranquilas (muita inveja) e o estádio Parque Osvaldo Roberto fica a apenas 10 minutos de carro do hotel onde eu estava. Acordei às 9:00, peguei o café do hotel e segui com o brother Dudu para a cancha, onde chegamos às dez em ponto.

Nenhum problema para estacionar o carro, deixamos na rua lateral do estádio. Um flanelinha (muito incomum no Uruguai) tentou nos abordar, mas escapamos dizendo "no compriendo" no portunhol mais sem vergonha jamais visto abaixo do Trópico de Capricórnio. A bilheteria não tinha nenhuma fila apesar da proximidade do início da partida, pagamos os 150 pesos uruguaios (algo entre 16 e 17 reais) pelo nosso ingresso e entramos no acanhado estádio.

A arena do Racing é simples. Na verdade é EXTREMAMENTE SIMPLES, com uma pequenina construção que parece ser a sala do administrador do estádio e estava fechada no dia do jogo. Na parede, está escrito em tinta verde com o marcante orgulho que os uruguaios têm de suas paixões: "RACING CLUB de MONTEVIDEO" em letras grandes e "FUNDADO EL 6 DE ABRIL DE 1919" abaixo, em letras menores. Na frente desta construção, o nome "RACING" em cimento, sobre um simples banquinho verde. Tudo sob a sombra de um lindo e enorme pinheiro que deve ser mais antigo que o estádio.



O campo fica atrás desta construção, com acesso para as arquibancadas pelas laterais, o mandante pelo lado esquerdo e o visitante pelo lado direito. No lado do mandante, no pequeno corredor que leva às arquibancadas uma barraquinha parecida com a de um camelô que vendia bonés, gorros, chaveiros, shorts, cadernos e camisas do clube, tudo com uma qualidade duvidosa e preços pouco convidativos. 



A arquibancada é pequena e parecida com alguns estádios de pequenos clubes brasileiros. Nada de bancos, poltronas, lugar marcado, climatização e luzes coloridas. É bunda no cimento e sol no meio dos cornos por duas horas sem perdão. Placar não existe, seja computadorizado, eletrônico, manual ou aquela plaquinha escrita "Visitante", nada mesmo. Os uruguaios comparecem bem (imagino que cerca de três mil pessoas estavam no estádio) e estão sempre com suas garrafinhas térmicas de chimarrão, mesmo com a temperatura alta que fazia. A torcida do Wanderers (clube um pouco mais forte tradicionalmente que o Racing) fez mais festa na entrada dos times que a torcida mandante, o que me deu até vontade de mudar de lado, mas permaneci fiel aos "cerveceros". 



O banco de reservas é um parágrafo a parte no Parque Osvaldo. Localizado nas laterais do campo de jogo, em um curtíssimo espaço entre a linha lateral e o alambrado da torcida, o banco é um desses de concreto que encontramos nas pracinhas mais antigas. Sem nenhuma cobertura, proteção contra o sol,  xingamentos ou objetos arremessados pela torcida e conforto zero! É possível se aproximar e ficar conversando com os jogadores reservas, como algumas crianças presente faziam. Inclusive tinha um garotinho que a mãe ficava mandando dar tchauzinho para o papai, um dos suplentes de "La Escuelita".



Enfim a peleja teve início e o Wanderers partiu com tudo nos primeiros minutos, acuando os donos da casa e dando a impressão que marcaria a qualquer momento. E logo aos nove minutos, Sergio "Chapita" Blanco um andarilho e veterano artilheiro, uma espécie de Carlinhos Bala charrúa, abriu o placar para "los bohemios"' desviando de cabeça uma cobrança de falta. 

Depois do gol, curiosamente a torcida local acordou, passou a incentivar a equipe, que passou a organizar melhor seus ataques. Diego Zabala e Daniel Acosta (que durante o jogo eu só chamava de 18 e 14) tramavam boas jogadas pelo lado esquerdo de ataque e chegavam com perigo. Em uma cobrança de escanteio após um milagre feito pelo goleiro Cristóforo, Zabala achou o capitão Rodrigo Brasesco livre na área para empatar em uma fácil cabeçada . 

Depois de CENAS LAMENTÁVEIS® protagonizadas em um lance que um zagueiro do Racing chegou pesadíssimo no Chapita, o Racing conseguiu a virada ainda no primeiro tempo. Acosta foi derrubado na área e Luis Gorosito, sob protestos tímidos da torcida cobrou para marcar 2 a 1 no placar (nesse caso é apenas modo de falar).  E não faltou o sinalizador com fumaça dentro de campo, interrompendo o jogo por alguns minutos.



Não há muito a se fazer no intervalo, talvez comer um pancho (cachorro-quente) e beber um refrigerante (também não vendem cerveja nos estádios uruguaios) com preços salgados. Mesmo assim fiquei tirando umas fotos, fui ao banheiro e quase perdi o gol de empate dos bohemios, mais uma vez marcado por Blanco, em nova cobrança de falta, escorada desta vez com um carrinho muito oportunista.

Mas a torcida racinguista não se abalou. Jogando bem, o time dominou o segundo tempo com grande atuação de Zabala. E novamente o meia fez dobradinha com o capitão Brasesco em cobrança de escanteio para superar Crisóstofo aos quinze minutos: cabeçada fulminante, 3 a 2 e bonita festa dos cerveceros. 

Foi então que apareceu a grande figura da partida: um senhor ranzinza bem próximo a mim na arquibancada desandou a descascar o treinador Rosário Martinez, xingando-o, exigindo a substituição de Gorosito (que caiu em desgraça com a torcida após perder um pênalti na partida contra o Peñarol). O poder vocal e a insistência na corneta era de matar qualquer Seu Walter de inveja. Sua voz está registrada no vídeo do gol de Gorosito de pênalti, quando ele vuvuzela o batedor um segundo antes da cobrança. 

O Racing então cansou, precisou substituir Zabala e Acosta, seus jogadores mais criativos e cedeu espaços para o Wanderers. O castigo veio aos 38 minutos do segundo tempo, com um pênalti cometido de forma infantil que permitiu ao endiabrado Blanco fazer o seu hat-trick, colocando números finais no jogo. 

Antes do apito final, ainda houve tempo para uma nova aparição das CENAS LAMENTÁVEIS® em um lance engraçado após um atacante do Racing se enroscar no pescoço do goleiro do Wanderers que levantou com jogador na "carcunda", fazendo-o dar uma cambalhota no ar. Infelizmente perdi o lance inusitado, mas o "desenrolo" da confusão está aí, tão mal filmada por mim quanto a cobrança do pênalti.



Fim de jogo, os torcedores do Racing ficaram chateados por ceder o empate no fim, mas eu saí muito feliz do estádio. Assisti a um jogo de futebol muito divertido, vivi a cultura de torcedores que amam seu clube incondicionalmente, sem esperar nada em troca (nem mesmo vitórias ou títulos), além de possivelmente ter assistido um possível jogador importante do futebol uruguaio em seu início de carreira: Zabala, de 22 anos, líder em assistências do campeonato uruguaio, que brevemente estará em um dos gigantes do futebol local. 

O mais importante é ver o quão apaixonante é o futebol e imaginar quantos estádios simplórios como o Parque Osvaldo recebem partidas, torcedores e suas emoções em um fim de semana espalhados pelo planeta. Quantos coroas corneteiros não pedem para que "se cambie" Gorositos por este mundão afora? Quantos Rosários não são xingados e vibram junto com os adeptos a cada gol? E eu saí deste estádio com um imenso lamento por algumas pessoas. Deve ser muito triste não gostar deste assunto, o "mais importante entre as coisas menos importantes". 

Viva o futebol!




Ficha do jogo: 


Local: estádio Parque Osvaldo Roberto em Montevidéu. Árbitros: Jonathan Fuentes, Eduardo Aguirre e Daniel Olivera.
RACING: Leandro Gelpi, Jesús Trindade, Rodrigo Brasesco, Pablo Lacoste, Enzo Ruiz, Carlos Díaz, Ernesto Dudok,   Agustín Gutiérrez (68′ Leandro Ezquerra), Diego Zabala (86′ Cristian Tabó), Carlos Acosta (90′ Marcelo Gamarra) e Luis Gorocito. Técnico: Rosario Martínez.
WANDERERS: Federico Cristóforo, Mauricio Gómez, Gastón Bueno, Martín Díaz, Maximiliano Olivera, Santiago Martínez, Matías Santos, Adrián Colombino (64′ Diego Riolfo), Gastón Rodríguez (76′ Yuri Galli), Rodrigo Pastorini (87′ Pablo Lavandeira) e Sergio Blanco. Técnico: Alfredo Arias.
GOLS: 9′, 47′ e 83′ Sergio Blanco (W), o terceiro dele foi marcado num pênalti, 28′ e 60′ Rodrigo Brasesco (R), 45′ Luis Gorocito (R) pênalti.
Cartões amarelos: 14′ Ernesto Dudok (R), 16′ Adrián Colombino (W), 18′ Carlos Díaz (R), 24′ Gastón Rodríguez (W), 45′ Gastón Bueno (W), 48′ Enzo Ruiz (R), 73′ Rodrigo Brasesco (R) e Federico Cristóforo (W).

segunda-feira, 29 de abril de 2013

A Gagau do subúrbio é mais legal




Muito se falou neste mês sobre um texto de um pai cretino que dizia que a filha ficaria sem o seu gagau. Para toda uma vizinhança em um bairro do subúrbio do Rio de Janeiro, entretanto, o neologismo traz algumas boas lembranças.

Gagau era uma risonha mulata, com seus 35 anos, ainda bonita mas no início do inevitável processo de embarangamento que acomete a maioria das mulheres. Ela "se juntou" com Bilo-Bilo (tinha esse apelido por um problema na dicção similar ao do Cebolinha e "Biro-Biro" era uma das palavras mais engraçadas que ele falava) quando tinha ainda uns 16 anos, mas se separou depois de não suportar mais as bebedeiras e traições do fogoso Bilo-Bilo. 


Gagau trabalhava na casa de Dona Mirtes, uma solitária e simpática viúva que era dona da barraca de doces da rua e morava junto com a patroa. Seu quarto era em uma quitinete no mesmo quintal, onde Gagau só ia para ouvir música no rádio (Gagau não curtia novelas) e dormir. Depois de se separar,sem filhos, Gagau começou a demonstrar interesses por adolescentes que formavam um animado time de futebol. 


Entre os atletas, goleiro Bozo (dono de um "belo" penteado), os zagueiros Kichute (Uma espécie de "nike hétero" da época) e Arlito (na verdade Carlito, mas assim como Bilo-Bilo, não procurou um fonoaudiólogo na infância, quando recomendado), o volante Bôster (Assim como seu "quase xará" James Buster Douglas, era capaz de bater até no Mike Tyson), o pequenino meia Cu-de-Cobra, os atacantes Zépi (abreviação de "Zé Pilintra") e Ociz (o pessoal dizia que ele era tipo um Zico ao contrário), entre outros. 


A casa de dona Mirtes era atrás de um dos gols do campinho, e Gagau costumava deixar umas garrafas de água no "congelador" (saudades de congelador, hoje é tudo essa coxinhice de freezer) pra galera matar a sede depois dos jogos. Inevitavelmente, a bola caía no quintal de dona Mirtes de vez em quando, nas horas em que a força superava a técnica em chutes de média/longa distância.


Numa dessas, ao tocar a campainha para pegar a bola, o galã do time, Ociz foi convidado por Gagau para tomar um suco com as goiabas da árvore no quintal de dona Mirtes (que, nos horários de jogos, já tinha fechado a barraquinha de doces e não perdia suas novelas por nada). Ociz atirou a bola do próprio quintal por cima do muro para o campo mas não voltou e então eles foram para o quartinho de Gagau e o inábil canhoto conseguiu uma história para se gabar no dia seguinte.


Algns dias depois, foi Cu-de-Cobra quem aceitou o convite. Depois vieram Arlito, Bôster, Kichute e quase toda a turma. Um a um todos os atletas tiveram seu(s) dia(s) com a Maria-Chuteira mais famosa da Rua de Baixo, Campinho e adjacências. 


A rapaziada passava a "caprichar" nos chutes tortos com o objetivo ser o responsável por buscar a bola (ou "buscar a vergonha", como se diz ainda hoje no subúrbio) na casa da dona Mirtes. Até Bozo caprichava nas espalmadas, até em bolas facílimas de encaixar.


Mas a alegria, como diz a canção (se nenhuma canção diz, deveria dizer) um dia acabou. Não para Gagau, mas para os garotos que foram crescendo, virando adultos e perderam a preferência da sapeca torcedora para a nova geração que surgia.